O Projeto Força
Feminina de Salvador realiza no próximo dia 30 de março o 1º Cirandas Parceiras
de 2016 com a temática “Rede de Articulação Social”. O encontro pretende
fortalecer a relação entre as diversas instituições vinculadas ao projeto para
garantir os direitos das mulheres em situação de prostituição e outros grupos
vulneráveis.
sexta-feira, 18 de março de 2016
quinta-feira, 3 de março de 2016
Carnaval e Invisibilidade social
Rose Cristiane Salvador
O
Carnaval de Salvador é um fenômeno que nasceu no início do século 20 com as reuniões
de foliões em clubes e bailes, não tendo nunca se furtado a reafirmar uma das suas
mais belas características, ser o carnaval soteropolitano uma festa,
fundamentalmente feita na rua, onde famílias inteiras desfilavam fantasiadas,
dançavam e se divertiam no centro antigo da cidade do Salvador.
Em
1950 com a invenção da guitarra baiana e a invasão dos trios elétricos às ruas,
diminui-se substancialmente a folia nos bailes e clubes, dando início a era dos
blocos de mortalhas. Gradativamente surgem trios associados a blocos de
carnaval fechados (com cardas), composto por foliões vestidos por abadás e
endossado pelo surgimento das megaestruturas de luxo dos camarotes que juntos
passam a dominar o Carnaval soteropolitano em um movimento elitista e
excludente, por muitos chamados de a privatização das ruas, isso porque:
A
rua, só em certos momentos: procissões, paradas cívicas e festas, que na Bahia
são conhecidas como festas de largo. Para além dessas circunstâncias, a rua é
lugar de trabalho, de compras, de serviços – a rua é sempre funcional. (FREYRE,
1951, v. 1, p. 18)
Uma
forte tendência vem caracterizando o carnaval de Salvador nos últimos anos, a
de ter no espaço da rua a sua mais liberta e feliz morada. Um espaço
democrático, onde a rua volta a ser de todos, agregando cada vez mais diversidade,
e como dizia o poeta Caetano Veloso na canção Um Frevo Novo: “A praça Castro
Alves é do povo, como o céu é do avião (...)”. É certo que na rua continuam os
camarotes e o bloco de abadás, mas também tem as fanfarras, as bandinhas, os
batuques, as escolas de samba, a Mudança do Garcia, afoxés e blocos de índios
que pelo simples fato de estarem na rua ratificam, valorizam e legitimam o
verdadeiro o poder popular de uma festa tão poderosa.
O
Carnaval é uma manifestação cultural, popular e ritualística que tem um forte
significado social. É a reafirmação de uma posição e ideologia onde fantasia e
realidade se misturam, e travestidos, reis, mendigos, princesas e palhaços
transitam em iguais condições de diálogo e convivência, tendo na apropriação
desse ritual a garantia para penetrar no coração da cultura de uma sociedade,
na sua ideologia dominante e no seu sistema de valores, podendo assim
transgredi-los.
(...)
Ver e ser visto são duas faces de uma mesma moeda, em geral, nos encontros
humanos. Por isso, as histórias de espionagem nos fascinam e mobilizam tanto, elas
dividem a unidade da experiência social em duas partes: um personagem vê (sem
ser visto) e o outro é visto (sem ver e sem saber-se visto). A solução da trama
depende do esforço titânico do protagonista que, no último capítulo, consegue
inverter a posição relativa dos personagens, redefinindo a equação: quem
observa quem, afinal. (SOARES, 2008, p.165)
Nesse
contexto, podemos afirmar que é o ritual que nos permite tomar consciência das
cristalizações dos papeis sociais, onde cada um dos lados (fantasia e
realidade) permite “esquecer” o outro e ser a sombra e a luz em um mesmo objeto
de estudo.
Um
jovem pobre e negro caminhando pelas ruas de uma grande cidade brasileira é um
ser socialmente invisível. (...) No caso desse nosso personagem, a
invisibilidade decorre principalmente do preconceito ou da indiferença, uma das
formas mais eficientes de tornar alguém invisível é projetar sobre ele ou ela
um estigma, um preconceito. Quando fazemos, anulamos a pessoa e só vemos o
reflexo de nossa própria intolerância. Tudo aquilo que distingue a pessoa,
tornando-a um indivíduo; tudo o que nela é singular desaparece. (SOARES, 2008,
165)
A
Invisibilidade social é um problema conjuntural que atinge a sociedade como um todo,
abrangendo do primeiro ao terceiro mundo. Esta miopia social é uma mazela em
que todos sofrem as consequências, diferindo apenas, a forma como a sociedade
vai encará-la e trata-la.
Para
tanto cria-se em 2013 a ação denominada: Carnaval Social - um espaço democrático
de folia e informação, que tem como objetivo dar visibilidade as ações
desenvolvidas pelas Instituições locais, promover uma ação social conjunta e fortalecer,
ainda mais, a rede de atendimento sócio assistencial junto à população do Pelourinho
e adjacências. Esta ação é promovida pelo Projeto Força Feminina - instituição
social, de caráter pastoral, iniciativa do Instituto das Irmãs Oblatas do
Santíssimo Redentor que tem por missão a promoção integral das mulheres em
situação de prostituição, de maneira a colaborar no processo de conscientização
e inserção cidadã.
O
nascimento do Carnaval Social foi um processo constituído através da organização
coletiva e articulada das instituições que desenvolvem seu trabalho junto a uma
população vulnerável e invisibilizada do Centro Histórico de Salvador, e teve
por consequência natural a nomeação do seu “cordão” momesco de O Bloco dos
Invisíveis.
Ser
invisível é não fazer parte do todo, ainda que se queira. É estar presente em
um corpo sem alma, sem movimento ou querer. É, por muitas vezes, não reconhecer
a necessidade de estar presente, integral e fazer suas próprias escolhas ou até
mesmo desejar passar despercebido diante delas. Podemos ser invisíveis em
diversas situações na vida, com ou sem ônus. Mas, dentre as diversas formas de miopia
social, destacamos aqui a invisibilidade que maltrata, exclui e aliena, e é no
combate a esse tipo de invisibilidade que o bloco dos Invisíveis dentro do
projeto Carnaval Social se torna uma valorosa ferramenta geradora de diálogo, troca
de saberes e acesso a direitos sócio assistenciais para a população carente do
centro histórico do Salvador.
Referência Bibliográfica:
FREYRE, Gilberto: Sobrados e
Mocambos, Prefácio à 1ª edição,. Rio de Janeiro, José Olímpio Editora, 1951;
SOARES, Luiz EDUARDO; BILL,
Mv; ATHAYDE, Celso: Cabeça de Porco. 1. Ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008
VELOSO, Caetano - Música : Um Frevo Novo – 1977.
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